TG35SS - Volume 1: Invocação do Herói (Einherjar Desperta) - Capítulo 3: Os Desastrados [Parte 2]

 

                                                              Parte 2

 

 Uma semana havia se passado depois da missão bem-sucedida. A avaliação do 35° pelotão passou por uma drástica mudança para melhor.

 Desde a missão do <Salmos Sem-Traço>, eles confiscaram mais três Heranças Mágicas até então. Rumores sobre as conquistas do pelotão dos zeros-à-esquerda durante a semana já alcançaram os membros de outros pelotões. Apesar disso, a pessoa sobre a qual estava sendo falada era Ootori Ouka apenas.

 Os outros membros eram vistos ainda mais pateticamente em relação a antes.

 Pelo corredor que ligava as salas dos primeiros-anistas, Ouka andava com as costas eretas, passando por estudantes petrificados cujos olhares eram atraídos por ela.

 - Ei, não é aquela que entrou para o pelotão dos zeros-à-esquerda por causa de um acordo especial?

 - Porque a antiga <Dullahan> não fala nada?

 - É a primeira vez que vejo uma <Dullahan> também.

 - Em uma semana ela confiscou sozinha três de nível D? Isso é impressionante... Habilidades de <Dullahans> devem ser incríveis.

 - Ela é bonita, elegante e forte. Acho que me apaixonei.

 - O rumor é que os zeros-à-esquerda estavam tão mal que o diretor chamou uma profissional para ajudar, não é injusto demais?

 - Verdade, um desperdício de pessoal. Olha esse bando de desajeitados, especialmente o capitão! Você viu os olhos do mal e aquela espada pendurada na cintura? Será que ele não se toca que são uns inúteis?

 - O pelotão fica em último lugar por causa dele, não? Francamente.

 5 metros atrás de Ouka estava o trio do 35° pelotão. Estudantes olhavam brevemente para eles com desprezo.

 Em primeiro lugar, ele estava acostumado com esse tipo de coisa e deveria estar rindo de tudo isso, mas pela primeira vez ele estava preocupado. Se uma ajudante de alta classe entrar em um pelotão cheio de desastrados, é claro que queixas e críticas dos outros estudantes viriam de toda parte.

 Ainda pior que o normal, os membros além de Ouka se arrastavam pelos corredores.

 

 As aulas matinais haviam acabado e Usagi estapeou com força a mesa com ambas as mãos.

 Qual o significado disso, Ootori Ouka?

 Usagi questionava Ouka, que fazia a manutenção da sua arma. Ouka inclinou a cabeça em dúvida, esboçando uma expressão gélida.

 - Significado de o quê?

 - Sua atitude de todos os dias! Você está nos fazendo de idiotas?

 - Não era essa a minha intenção. Se fui rude, eu peço perdão, me desculpe.

 Após uma resposta tão direta de Ouka, Usagi soltou um gritinho agudo como um “Giiiiiiiiii”.

 - Eu disse para se explicar, não se desculpar.

 - Por isso que eu disse, sobre o quê?

 - Por que você está sendo egoísta, nos excluindo das investigações e continuando a trazer de volta Heranças Mágicas quando te dá vontade? Estamos sendo completamente desprezados por causa disso!

 - E não está ótimo? Vocês podem ganhar pontos sem fazer nada. Por que estão insatisfeitos?

 - Não queremos uma máquina automática de pontos! Você sabe o quão horrível nós nos sentimos por causa do seu individualismo?

 - Se vocês querem trabalhar, trabalhem em outras missões. Eu estou bem sozinha.

 Ouka estava usando aquele tom de voz desde o incidente do <Salmos Sem-Traço>.

 Não é para menos que Usagi se enraiveceu. Mesmo Takeru não estava convencido disso, “ Qual o problema?” era o que ele pensava sobre isso.

 Usagi estava com o rosto vermelho e parecia que fumaça iria sair pelos ouvidos. Ela andou até ouka para segurá-la.

 - É a primeira vez... que alguém me insultou desse jeito... Quem você pensa que é?!

 - Takeru parou Usagi, que estava prestes a pular em cima dela. Ele tentou apaziguar a fera com tapinhas nas costas.

 - Deixe quieto, é uma perda de tempo tentar falar com essa mulher. Ela só está preocupada consigo mesma.

 Ikaruga disse para Usagi enquanto lia uma revista erótica no topo da mesa de reparos.

 Ouvindo tais palavras, Ouka soltou um pequeno suspiro.

 - Deixem-me dizer uma coisa, isso é o melhor para o 35° pelotão e para vocês.

 - Ooh, o melhor para nós? Por que você não nos conta por quê? Como você chegou a essa conclusão?

 Ikaruga perguntou enquanto deixava a revista na mesa, ela sorriu sem medo nenhum enquanto cruzava os braços.

 Ouka respondeu:

 - Nesse caso, vou deixar as coisas bem claras.

 Ela deixou sua arma favorita na mesa enquanto se levantava.

 Todos os membros olhavam para ela. A sala ficou em silêncio com todos os olhares voltados para Ouka.

 Ela disse, indiferente:

 - Sua melhor escolha é não fazer nada.

 Ikaruga estreitou os olhos, Usagi se levantou querendo dizer alguma coisa e como o esperado, Takeru franziu o cenho.

 - O que.. Você quis dizer?... – Perguntou Usagi.

 - Quis dizer que, de maneira simples, se vocês partirem para missões com suas habilidades contra as organizações de Heranças Mágicas, as chances de vocês morrerem é alta.

 - O qu-?... Você está dizendo que...

 - Se eu for sozinha, as chances de sobrevivência e sucesso são maiores.

 - Como é que é???

 - Primeiro, Saionji. Tem um erro fatal nos seus tiros. O atirador de alite é um dos pilares em muitas missões. Você deveria apoiar a vanguarda em território inimigo. Mas o seu nervosismo faz com que você atire em uma direção completamente diferente enquanto seus aliados caem um por um. Não quero deixar a minha cobertura com uma pessoa dessas. Se possível, eu gostaria que você sequer tocasse mais em um rifle.

 - Gu......nghhhhh..

 - Usagi fez uma cara frustrada, seus olhos se umedeciam.

 Então Ouka olhou para Ikaruga.

 - Suginami, você também. Vou admitir que sua habilidade como armeira é tão incrível quanto parece. Mas dessa vez você foi longe demais. Não remodele minha arma sem permissão. Não vá equipando com um modo automático. Não vou ser capaz de usar por conta da baixa capacidade do pente. Isso é claramente uma remodelagem ilegal.

 “ Então ela faz coisas assim...”

 Takeru não conseguia usar armas, mas ele ainda estava chocado.

 - A capacidade do pente não importa, importa? E contanto que você segure firme na sua mão, você deve conseguir lidar com o coice.

 - Mesmo se ignorarmos o caso do coice, como você vai explicar o modo automático?

 - O mecanismo do modo automático?

 - O pente carrega nove balas. Pelotões de teste não têm permissão para usar outras partes da empresa Alchemist se não aquelas fornecidas pela academia. As peças foram obviamente contrabandeadas.

 - O fruto proibido é o mais gostoso, não se preocupe tanto com isso~

 A opinião de Ikaruga sobre proibições é bem suspeita. Ouka distorceu a boca, descontente, considerando que argumentar com Ikaruga não daria em nada. Ela se levantou ruidosamente, empurrando a cadeira no processo.

 Então ela andou até Takeru, ao lado de Usagi, que estava bastante abalada; e olhou diretamente para ele.

 - E por último... Kusanagi.

 Apesar de ter usado um tom de voz sem emoção para as outras duas, o tom com Kusanagi era diferente.

 Takeru grudou em sua cadeira e se endireitou com o susto, produzindo um “Gulp” com sua garganta.

 Na face de Ouka, desprezo estava visivelmente estampado.

 - Você não deveria continuar capitão. O que eu acabei de dizer a essas duas deveria ter saído da sua boca. Você quer que seus membros morram?

 Estava completamente correto. Não havia o que responder.

 Takeru estava ciente desse ponto, mas como ele poderia criticar e falar tais coisas quando ele mesmo não era melhor do que elas? Ele sempre acabava pensando como seria patético se ele acabasse dizendo.

 - Ou talvez seja porque você não quer agir como um chefão quando você mesmo não é diferente das duas?

 Ele foi totalmente desmascarado.

 - ...Isso que te desqualifica de ser um capitão.

 Ele não podia dizer nada em resposta. Uma pessoa com uma atitude daquelas não foi feito para ser capitão.

 Takeru não conseguia nem mesmo dizer nada autodepreciativo, foi o que ele sentia na situação.

 - ... É como você disse, ...provavelmente. – Disse ele, enfim.

 Takeru sentiu a sua habitual dor de barriga e por algum motivo, o cabelo de Ouka se sacudiu, seus olhos se abriram mais e sua expressão ficou ainda mais severa.

 - Você não tem nada do que é preciso para ser um inquisidor....!

 Ouka, revelando a sua fúria, se virou para Takeru e agarrou-o pela gola do casaco.

 Incapaz de reagir ao acontecido, ele foi puxado até ela.

 - ....Ootori.

 - O diretor me disse sobre sua motivação... Você quer esse trabalho por causa do dinheiro, seu ganancioso. Deveria se envergonhar.

 - .......!!

 - A inquisição está apodrecendo por conta de babacas egoístas como você!

 - Takeru estava calado.

 Naquele momento, sua visão estava tingindo-se de vermelho e ele quase voltou a sua antiga versão.

 “ Você não tem o direito de falar assim comigo “

 “ O que você sabe sobre mim? “

 “ O que você sabe.. Sobre nós? “

 Era o que Takeru se esforçava para não gritar em resposta.

 Olhando objetivamente, Ouka não sabia nada sobre Takeru.

 O oposto também era verdade, Takeru não sabia nada sobre Ouka.

 É por isso que ele resistiu, ele não respondeu, ele engoliu as palavras.

 - Você certamente age com o rei na barriga avaliando a gente, mas você tem mesmo a moral para fazer isso? – Ikaruga disse, sentada em sua cadeira.

 - ....Como?

 - Você diz que Kusanagi não está qualificado, mas e quanto a você? Em primeiro lugar, Ootori, Você não tinha voltado para a academia porque sua licença foi tirada de você?

 Quieta, indiferente, Ikaruga acusava Ouka.

 Ouvindo isso de Ikaruga, Ouka abaixou o olhar e se manteve em silêncio.

 - Eu sei como você é chamada pelos seus colegas inquisidores.

 - .....Nghh

 - <Calamidade (Princesa Lótus Rubra)>. Desobedecendo ordens e matando todos os culpados. Você torna cada cena de crime em um mar de sangue, como uma praga. Não é algo que uma pessoa normal faria.

 - ... Você... Me investigou sem permissão da academia...

 - Isso não vale para você também? Você já sabia sobre o Kusanagi e a vontade dele de se tornar inquisidor.

 - Isso veio... Do diretor.... Ngh

 Depois de poucas palavras, ela engoliu o resto delas e apertou os punhos em um barulho quase audível.

 - .............

 No fim, ela não se opôs à Ikaruga. Ela fechou os olhos de se virou de costas.

 - Tudo isso que você disse sobre mim.... Não vou negar. Mas quando se trata das atividades do pelotão, eu não tenho intenção nenhuma de voltar atrás. Kusanagi não é digno de ser capitão de acordo com o meu julgamento.

 A cabeça de Ouka estava de volta ao lugar. Ela está normal de novo.

 Com as costas viradas para o pelotão, Ouka caminhou até a saída.

 - Digo o mesmo sobre as outras coisas que disse. A previsão sobre a probabilidade de morrerem durante a missão está correta. Eu me nego a morrer junto de vocês.

 - ................. – Todos os três ficaram sem o que falar.

 - Era tudo o que eu queria dizer.

 Com essas últimas palavras, Ouka deixou a sala. *Clang* ressoou no desconfortável silêncio deixado para trás. Uma tosse estranha para o momento podia ser ouvida.

 - Ela está completamente certa sobre as próprias habilidades e não confia em nada que não ela mesma.

 - Bom, as coisas que ela disse estão mais ou menos certas.

 - Parecia que ela estava especialmente emotiva no seu caso, Kusanagi. Algo aconteceu entre vocês dois?

 Takeru reviveu os eventos de uma semana atrás em sua cabeça.

 Relembrando de sua mão segurando aquela maciez, Takeru corou.

 Depois de olhar para o rosto de Takeru, Ikaruga colocou uma bengala de menta que estava sobre a mesa de trabalho e olhou para o teto.

 - ... Seu garoto tarado.

 - ?!

 Ele olhou para Ikaruga, surpreso. Seria possível que o rádio estivesse ligado naquela hora e ela havia escutado tudo que havia acontecido?

 Takeru deixou seus ombros caírem.

 - Ouvi dizer que a reação dela contra bruxas e criminosos é anormal. O ódio dela por eles é óbvio.

 - Então você chegou mesmo a investigar ela... você também estava procurando um jeito de lidar com a Ootori também, não?

 - Não, eu estava procurando por uma fraqueza

 - ... Imaginei...

 Ikaruga comentou sobre a observação de Takeru:

 - Nem precisei procurar por muito. O apelido <Calamidade (Princesa Lótus rubra)> é bem famoso. Ela apreendeu um número enorme de Heranças Mágicas, mas o número de mortes é surpreendentemente grande, também.

 - ...............

 - Fico pensando se é por causa de algo que aconteceu no passado.

 “Não que eu esteja muito interessada” completou Ikaruga, que voltou a pôr outro doce na boca.

 Quantidade de pessoas mortas é grande e Takeru por acaso também sabia algo sobre. No caso do <Salmos Sem-Traço> na semana anterior, ele percebeu quão perigosa ela era.

 “ ...Vou exterminar vocês... Bruxas também... Todos vocês...! “

 Havia um ódio enorme residindo nessas palavras.

 Seria uma mentira se ele dissesse que, como outro membro do mesmo pelotão, ele não estava curioso.

 - Aquela lá, ela esteve sempre sozinha. Por causa da atitude, ninguém estava disposto a se aproximar dela, ela também persistia em dizer “Não” para todos os convites que fizeram. O motivo para isso... é a personalidade degenerada dela. No final das contas ela tem mesmo um temperamento e tanto, desde quando eu a conheci.

 - ........... x2

 - hm? Por que vocês duas estão olhando assim para mim?

 - E você ainda pergunta?! x2

 

 - O que foi? – Disse Ikaruga, chupando outra bala de menta.

 Enquanto a atmosfera se descontraia, Usagi se recuperada do medo durante a discussão com Ouka. Ela era inesperadamente fraca durante brigas. Mas agora ela havia voltado a falar com a arrogância de sempre.

 - Puxa vida, aquela mulher não consegue mesmo ser sincera! Por que ela não consegue como todo mundo?

 - ... Fazer o quê, Usagi?

 - Sobre Ootori Ouka, ela é terrivelmente atrapalhada. Ela deveria ser mais honesta consigo mesma.

 - Hummmm... Você sabe de alguma coisa sobre ser assim?

 “Por que você não nos conta?” – Induzia Ikaruga, Usagi, que falava em um tom convencido.

 Usagi fungou, estufando o peito orgulhosamente.

 - Obviamente. Já que eu sou uma dama exemplar.

 - Haa.

 - É simples, ouçam. Aquela mulher não tem amigos, ela quer ser nossa amiga. Ela é desajeitada para essas coisas e não consegue se aproximar, é por isso que ela se fixou tanto em você, o capitão. “Eu sou melhor que você, então me deixe ser um de seus companheiros”, ela pede para aceitarmos ela desse jeito. Ela é durona e desonesta. Eu vou fazer com que ela seja nossa amiga com certeza.

 - Ela tem uma atitude de quem parece que vai recusar no mesmo segundo.

 - Em outras palavras.. Ootori Ouka está apenas solitária!

 “ Fu fu fun” - Usagi estufava ainda o peito com uma cara orgulhosa.

 Por coincidência, Takeru e Ikaruga tiveram a mesma impressão.

 - Essa aí não é você? X2

 - O que?! Vocês estão dizendo que eu sou solitária?

 - Você ficou sozinha durante todo o ensino fundamental, sem um único colega. Você tem o rosto solitário de alguém que foi deixado de fora.

 - E-eu não estava.. Me sentido solitária ou nada assim!

 - Mas isso não muda o fato de que você não fez nem um amigo sequer.

 - Guhhhh.

 - Eu fico pensando se coelhinhos realmente acabam morrendo por solidão~

 - Nghhhhhh, Ikaruga Suginamiiiiii!!!

 *Bam* * Bam*, Usagi avançava para cima de Ikaruga, ela tentou agarrá-la mas não chegou a alcançar.

 Nessa barulhenta sala de pelotão, Takeru pensava no que fazer.

 O que Ouka havia dito era verdade, mesmo se ela trabalhasse por conta própria, ela irá ganhar pontos.

 Mas dessa forma, não haveria sentido ter um pelotão. Como um capitão, essa escolha era inaceitável para ele e os outros dois membros.

 “Agir como um capitão... Fato é que Ootori estava certa na maioria das coisas. Eu deveria pensar sobre o futuro do nosso pelotão”

 Ele deu um pequeno riso.

 “Ela quer ser reconhecida como uma colega de pelotão, huh”

 “Apoiar uns aos outros. Se isso fosse possível, então isso ocasionaria em uma melhora geral das habilidades de todos. Antes, não éramos capazes de cooperar direito. Para poder adicionar a força de Ouka à nossa. Para poder fazê-la oferecer suas habilidades. Para poder fazer com que ela cooperasse conosco... Não, não precisamos ir tão longe assim. Se fizermos ela se associar com qualquer outra pessoa, isso definitivamente trará bons resultados. Afinal de contas...”

 - ... Fazer dela nossa companheira seria bem difícil a esse ponto.

 Takeru se levantou da cadeira e se aproximou das outras duas. Ele se apoiou levemente com as duas mãos em cima da mesa e fechou os olhos.

 “Agora que estamos aqui, não vamos desperdiçar tudo o que aprendemos com a vida” Takeru disse a si mesmo.

 - Eu tenho uma proposta.

 Depois de abrir os olhos, um senso de dever e de confiança podia ser visto neles.

 

 Alguns minutos depois.

 Três pessoas estavam grudadas em uma parede na entrada do refeitório, esticando suas cabeças para dentro. Os três estavam com um telescópio, aparentemente observando alguém. Olhando de relance, parecia uma cena bem estranha. Mas na linha de visão estava o alvo... Ootori Ouka.

 -... Alvo localizado.

 - Como suspeitávamos, ela está almoçando sozinha.

 - O cardápio? Qual o cardápio dela?

 Ouka estava sentada sozinha na cadeira perto da janela com uma cara amarrada.

 E em cima da bandeja do refeitório estava...

 - ... Anpan e leite. Por que anpan e leite?!(nota: anpan é uma espécie de sonho de padaria recheado com doce de feijão)

 - Anpan e leite? Ela é igualzinha a você, Kusanagi.

 - Ei! Não tire sarro de anpan e leite! É super delicioso! Custa só 160 incluindo o leite! É gostoso e não pesa no bolso, simplesmente a melhor das combinações! (Nota: 160 ienes é aproximadamente R$4,50)

 - Sua voz está muito alta! X2

 - ...Desculpe.

 Takeru, que não podia ficar em silêncio sem demonstrar como ele se sentia a respeito de anpan e leite, foi reprimido, fazendo com que seus ombros caíssem.

 Eles continuaram a observar Ouka.

 Ela abriu a tampa do leite, usou as duas mãos para tirar o anpan da embalagem. Depois ela parou o que estava fazendo e *vup * *vup* , começou a olhar em volta cautelosamente.

 Os três se esconderam depressa.

 - Por que ela fica tão vigilante durante uma refeição?

 - .... Tem caroço nesse angu, com certeza.

 - T-tem algo de especial em anpan com leite...?

 - Temos que esperar até que ela baixe a guarda, mas por que será que ela está tão tensa?

 Os três respiraram fundo e engoliram a seco, Ouka finalmente trazia o anpan para uma mordida.

 E então *nhac*

 - Ela está comendo.

 - É, está sim.

 - Hum, comendo mesmo.

 Ouka estava apenas comendo um anpan, mas os três começaram a suar frio. Essa cena cada vez mais estranha atraia olhares curiosos das pessoas ao redor do trio.

 Após isso, Ouka pegou a garrafa com leite e bebeu em um único gole.

 Depois de alguns segundos,

 - 〜〜〜♪

 A expressão emburrada de Ouka derreteu como gelo.

 - .................. x3

 Do nada, Ouka fez uma expressão inacreditavelmente fofa. Os três estavam sem palavras. É como se ela mergulhasse em uma banheira quente depois de um dia cansativo, cheia de satisfação. Ouka tentou desesperadamente esconder aquela expressão.

 - .................

 E, novamente, naquele momento ela tirou outra mordida do anpan e sua expressão voltou para a anterior.

 -〜〜〜♪ humm *nhom nhom*

 Outra vez, o rosto carrancudo voltou após o bocado. Olhando com mais atenção, podia-se ver que ela batia levemente os pés enquanto levava alegremente o anpan à sua boca.

 Vendo uma cena como aquela, observando Ouka mostrar um cara tão adorável. Era a primeira vez que o trio via tal coisa.

 - ... É o favorito dela, esse aí.

 - fuu... Ela é tão atrapalhada, ela não esconde a felicidade nem um pouco.

 - Ela é... Inesperadamente normal.

 Takeru e Usagi estavam chocados demais pelo contraste entre as duas personalidades para poderem ser capazes de comentar qualquer coisa. Ikaruga exprimia um sorriso malicioso e tirava fotos repetidamente.

 - fufu, ufufufufu, usar... Eu posso usar isso aqui! Esse material pode ser usado de várias formas contra aquela mulher orgulhosa. C-com uma fraqueza dessas aqui, eu imagino que tipo de fantasia eu vou fazer ela vestir...

 - Ei, para que você está tirando essas fotos? Venha, vamos voltar!

 - A-anpanman no final das contas?! Uma heroína cujos únicos amigos são sua coragem e a pistola? O que acontece agora? E se houver algum problema com direitos autorais, o que eu faço, Kusanagi?! (nota: anpan-man é um super herói infantil famoso no japão, feito de anpan.)

 - Vamos recuar, venha logo!

 Depois de recolher Ikaruga, que estava gargalhando como maluca, pela gola da roupa, os três saíram do ponto onde estavam se escondendo.

 

 ... Uma hora e meia depois.

 - ... Certamente, quando eu ouvi sua proposta de atraí-la, eu achei que fosse ser um pouco mais... mais... Bem, diferente? – Disse Ikaruga com descontentamento.

 Ikaruga estava sentada em sua mesa de trabalho, fazendo recortes com tesouras em suas mãos. Mesmo que reclamasse, seus dedos não paravam de trabalhar. Depois de dobrado quatro vezes o papel, ela usou as tesouras para cortar a linha tracejada com um som de *Tchik*. A tarefa monótona de cortar os papéis e colar as peças com cola continuava já fazia uma hora.

 As decorações que Ikaruga havia feito pendiam por toda a sala do pelotão. Uma faixa de pano estava pendurada de uma parede a outra e dizia “ Pelotão dos zeros-à-esquerda Festa de boas-vindas para o novo membro”, escrito com uma letra meia-boca.

 Era o pináculo do masoquismo o próprio pelotão escrever “Pelotão dos zeros-à-esquerda” na decoração.

 - Haa, com isso Ootori deve se abrir um pouco com a gente.

 - Parece uma ideia que criança do maternal teria, essa sua aí.

 - Mas nesse livro “Como se Enturmar com seu Novo Funcionário” está escrito que uma festa de boas-vindas ajuda bastante!

 “Ele é um amador quando se trata de agir com inteligência” Pensou Ikaruga enquanto olhava Takeru.

 - Você acha que aquela Robocop vai ficar satisfeita com isso?

 - Nunca vamos saber se não tentarmos!

 - Para sempre um inconveniente... Só podia ser nosso capitão sem-amigos.

 - ...Bom, eu não tenho nenhum mesmo.

 - Nem eu.

Mesmo enquanto condenava Takeru e exprimia sua admiração, suas mãos não paravam. Nada menos da aspirante a <Regin (Ferreiro)>.

 - Mesmo que você diga isso, você continua nos ajudando.

 - Estou fazendo isso por serem ordens do capitão, mesmo que não funcione com a Ootori, a ideia merece certo crédito. Ainda assim, não entendo por que você teima com ela.

 Apesar de não aprovar Ouka como uma pessoa, Ikaruga admitia suas habilidades. Takeru coçava suas bochechas com uma expressão suave.

 - Bom, pode ser que tudo isso ainda não seja o suficiente.

 - É como se você estivesse apaixonado por ela.

 - ...Eh?

 - Um garoto se apaixona por uma garota, a qual deu a ele a oportunidade para mudar.

 - Não é nada disso! Eu quero fazer alguma coisa para ela como um companheiro.

 Enquanto Takeru tentava corrigir Ikaruga, Usagi vinha da pequena cozinha com passos leves em *Tap tap tap*

 - Acabei, Kusanagi. Deve estar delicioso, mesmo se quem diz é a própria confeiteira.

 Segurando um prato com um bolo de camadas com as duas mãos, Usagi ostentava o prato na frente de Takeru, cheia de confiança e de creme no rosto. Apesar de relutantemente usar o avental com estampa de coelhos que Ikaruga havia preparado, cabia muito bem nela.



 Takeru estava bastante surpreso.

 - Usagi você é muito boa na cozinha.

 - Eu aprendi da minha avó quando era criança. Olhe, um bolo de doce de feijões vermelhos e creme.

 “fufufun” – Usagi estufava o peito. Ikaruga fez um olhar curioso.

 - Doce de feijões vermelhos? E isso é gostoso...?

 - Humpf, reclame só depois de provar. Isso aqui vai impressionar aquela garota.

 Ela entregava pequenos pratos para Takeru e Ikaruga, parece que eram fatias para provar.

 Ikaruga agia como se estivesse preste a experimentar veneno, mas os outros dois estufaram o bolo para dentro de suas bocas sem pensar duas vezes.

  *Nhom nhom*, depois de mastigarem um pouco, os dois fizeram rostos impressionados.

 - ...oh? Que gostoso, inesperado.

 - Verdade, é super delicioso. Usagi, você tem talento mesmo.

 Depois de ouvir os elogios honestos de Ikaruga e Takeru, Usagi piscou, incrédula. Ainda que estivesse cheia de confiança alguns momentos atrás, ela olhou para o chão, embaraçada e com o rosto corando.

 - Não fico contente em ser chamada por esse nome... Mas ser elogiada desse jeito... E-eu não esperava por isso.

 - Não, não, é gostoso de verdade. Você é incrível, Usagi. Eu não consigo fazer nada além da minha esgrima.

 - ...É m-mesmo?  Está gostoso mesmo. Fico contente, muito contente que as pessoas gostem dos meus bolos... Valeu mesmo a pena preparar um.

 Mesmo que ela parecesse estar envergonhada, no fundo ela estava muito feliz. Usagi pôs as mãos no rosto enquanto escondia levemente a cara.

 Sentindo que Usagi estava agindo como sua própria irmã, Takeru quase instintivamente acariciou lhe a cabeça, mas então.

 - Estou entrando.

 Todos se viraram para a porta enquanto ela se abria com batidas na madeira.

 Takeru e os outros correram para pegar os cones de confetes e...

 *Pop* Pop* Pop* 

 Alguns sons descoordenados encheram a sala já que o trio estava fora de sincronia.

 Ouka entrou com uma aparência de surpresa no rosto, ela olhou para os lados e viu com desgosto os pedaços coloridos de papel caindo em seu cabelo.

 O ar dentro da sala congelou

 - ..... O que é que está acontecendo aqui?

 Ela mostrava um olhar intenso.

 Ainda assim, Takeru forçou um sorriso desajeitado.

 - ...E-erm, para dar as boas-vindas hoj-

 Então Takeru percebeu o estado em que Ouka estava, seu uniforme coberto de sujeira e sangue além dos arranhões por todo o seu corpo.

 - ... Você, que feridas são essas?!

 - O inimigo mostrou alguma resistência, a ocorrência de combate não é incomum. Eu completei a apreensão da Herança Mágica com sucesso, sem problemas.

 - Sem problemas...? Mas você está sangrando, não? Espere um pouco, fique bem aí.

 - Mais importante, o que é que se passa por aqui?

 Ouka estreitou os olhos e vociferou uma pergunta, levemente irritada.

 Ela encarou intensamente um dos membros, Takeru.

 - ...Organizando uma festa durante o período de atividades do pelotão, você está se divertindo bastante. Não é, capitão?

 - Não, isso é... Nós preparamos para você...

 - ...? Para mim?

 - Veja bem, ainda não preparamos uma, certo? Uma festa de boas-vindas.

 - ........

 Foi quando Ouka notou a faixa pendurada nas paredes.

 - Ainda não sabemos muita coisa sobre você e muito menos você sobre a gente, não é?

 - ..........

 - Então achei que seria melhor se todos nos conhecêssemos melhor antes.

 Takeru fazia um sorriso amargo. Ouka parecia estar incomodada, seus olhos estavam flutuando e ela parecia não saber o que fazer em resposta.

 Mas gradualmente uma sombra apareceu em seu rosto. Sua expressão gélida de sempre voltou e ela suspirou levemente.

 - ...Desculpem, não tenho tanto tempo livre assim. Vocês podem fazer como quiserem.

 - N-não diga isso. Suginami fez as decorações, Usagi fez um bolo de creme com doce de feijão vermelho. Eu... Não fiz tanto assim, mas por favor pense no que as outras fizeram por você.

 - Eu discordo dos seus modos confortáveis de ser. Eu, diferente de vocês... não entrei para a inquisição para brincar.

 Dizendo isso, Ouka abriu a porta novamente e saiu da sala.

 Sua silhueta, olhando por trás, não parecia zangada nem arrogante como sempre. Parecia apenas... Isolada.

 Takeru agarrou a maleta de primeiros socorros, pulou para fora da sala do pelotão, seguindo Ouka.

 - Ootori!

 Ouka cessou o movimento dos passos, irritada, e olhou para trás.

 - O quê?

 - Onde você está indo?

 - Não é da sua conta.

 - Espere um minuto, tem um ferimento horrível aí. Precisamos de primeiros socorros, pelo menos.

 A perna de Ouka sangrava consideravelmente, parecia tão ruim como se estivesse em um acidente de trânsito.

 Apesar de tudo isso, Ouka não demonstrava nenhuma intenção de tratar a ferida e voltou a caminhar vigorosamente.

 - Eu posso cuidar disso eu mesma. Já te disse antes, não tem nada a ver com você.

 - Somos membros do mesmo pelotão e eu sou seu capitão.

 - ... Agindo como um capitão só quando te convém...

 Ela olhou friamente para ele.

 Mas dessa vez, Takeru não se deixou ser intimidado.

 - Sim, ordens do capitão. Fique quieta e me deixe tratar do seu ferimento.

 Na frente do inesperadamente insistente Takeru, Ouka suspirou como se estivesse desistindo. Ela se sentou em um banco próximo do pátio.

 Tirando de dentro da maleta a gaze e o antisséptico, Takeru tocou gentilmente a perna de Ouka sem nenhum aviso prévio.

 - Uuhh?!

 - ? O que houve?

 - Não... Nada, se você vai cuidar disso, ande logo. Estamos perdendo tempo.

 Instruiu Ouka enquanto desviava o olhar com o rosto estava levemente tingido de vermelho.

 Para poder ver o ferimento mais claramente, Takeru primeiro lavou o sangue com água corrente.

 - Ótimo, a ferida não é tão séria apesar de todo o sangue.

 - Já te disse que não tinha sido nada, não falei? Parece pior do que é porque minha movimentação fez sangrar mais.

 - Mas ainda seria melhor procurar um médico dos <Seeley (curandeiros)>, já que algumas cicatrizes podem acabar se formando.

 - Não estou preocupada com isso, já tive outros ferimentos como esse antes.

 Com isso dito, Takeru estava encarando intensamente as pernas de Ouka.

 - ... Por que você está olhando para elas desse jeito...?

 - Ah não, não é nada... eu só percebi que você tem pernas muito bonitas.

 Seus pensamentos acabaram saindo pela boca sem serem filtrados, *pop* O rosto de Ouka repentinamente se avermelhou.

 - B-bo-bonitas?

 - É, são mesmo lindas.

 - Uhhhh?!

 - É difícil dizer de longe, mas você tem músculos flexíveis e um equilíbrio excelente. São quase perfeitas.

 -.... A-aahhh, é isso que você quis dizer.

 - Hm? O que mais poderia ser?

 - Q-que seja. Ande logo e acabe com isso.

 Ouka, corando, desviava o olhar. Takeru inclinou a cabeça em dúvida.

 Não significava que Takeru não pensava nas pernas com a beleza de uma garota, ele não era tão insensível, mas belo bem dos primeiros socorros, ele se livrou de seus desejos mundanos. De outra forma, ele voltaria a ser o Takeru desastrado e faria o ferimento piorar.

 Ele espirrou cuidadosamente o desinfetante na ferida.

 - ...Nghh.

 - Desculpe, doeu muito?

 - Tudo bem, estou acostumada com a dor.

 - Hahaha, você diz coisas estranhas.

 - O que é tão estranho no que eu disse?

 - Não tem como se acostumar com a dor, eu posso dizer por experiência própria. Você pode até aceitar a dor, mas não significa que vai parar de doer. Se você só expressar o fato de que está dolorida, o fardo mental vai ser menor do que seria se você se segurasse. Só uma dica.

 Rindo um pouco orgulhoso de si, Takeru continuou com o tratamento.

 - .........

 Ouka refletia sobre as palavras de Takeru. “Ele diz umas coisas estranhas, não?”, é o que seus olhos estreitados pareciam dizer.

 Chorar quando a dor é demais.

 Essas palavras pareciam se acumular e se empilhar de pouco a pouco em seu coração.

 Até que o tratamento de primeiros socorros estivesse acabado, Ouka estava se sentindo confortável enquanto seus olhos divagavam sem foco pela paisagem.

 - Certo, está feito – Disse Takeru, dando leves tapinhas no curativo e limpando o suor da testa,

 O ferimento na perna de Ouka estava “embrulhado” em uma quantidade absurda de bandagens. Parecia que havia um enorme calombo embaixo das ataduras.

 - ....Sinto como se minha mobilidade tivesse decaído drasticamente.

 - A-ahahahaha... Eu sou desastrado mesmo, não?

 Takeru em bons ares esboçou um sorriso tímido enquanto coçava sua cabeça, sem jeito.

 Depois de olhar para aquela aparência inofensiva, pensando que poderia ela mesma ter feito o curativo, ela perdeu a vontade de criticá-lo por isso.

 Ouka tocou as bandagens estranhamente atadas no ferimento em sua perna e se levantou com uma cara confusa.

 - E-eu não tenho que te agradecer. É algo que você fez por conta própria, sem permissão.

 - Tudo bem. Como um companheiro, essa não é a coisa óbvia a se fazer?

 - ...........

 “Essa conversa de sermos companheiros é confortável e desconfortável ao mesmo tempo” – pensou Ouka, caminhando para longe de Takeru.

 - Ei, espere, para onde você está indo?

 Takeru distraidamente deixou cair a maleta de primeiros socorros e se apressou para o lado de Ouka,

 - Atividades do pelotão. Vou resolver outro caso.

 - Com sua perna nesse estado? É melhor deixar para outro dia... Ou pelo menos inclua o resto do pelotão.

 - Não posso fazer isso. Aqueles que estou perseguindo são perigosos demais para vocês. É um peixe ainda maior do que o do caso da semana passada.

 - .... Ainda mais motivos para não te deixar ir. O que você está procurando, Ootori? Uma Herança Mágica? Uma bruxa?

 - Não é problema seu

 - É sim, eu sou seu capitão.

 Takeru usou sua autoridade como o capitão novamente, insistindo fortemente.

 Ouka estava certamente frustrada, mas a resposta não veio com tanta má vontade.

 Ela relutantemente parou e encarou Takeru com um olhar sério.

 - ...Você lembra do caso do <Salmos Sem-Traço>?

 - Hm? Claro.

 - Ainda não foi resolvido.

 Com isso dito, Takeru se lembrou de que era realmente verdade.

 Quando eles invadiram a sala, eles perderam o parceiro de compras de vista.

 - O maior mistério ali era o quão bem armados eles estavam. Com certeza era demais para bandidos quaisquer ou no máximo mafiosos. Se incluirmos a conversa que você escutou, parece que <Salmos Sem-Traço> não era a mercadoria principal da troca.

 - Será possível que você já conseguiu informações sobre a outra entidade da troca?

 - Não, ainda não cheguei tão longe assim. Mesmo que eu tivesse priorizado a interrogação desses outros, eles não me deram nenhuma informação útil além do fato de que o objeto da troca era um fragmento de uma Herança mágica. O único pedaço que eles conseguiram identificar foi uma lâmina, deve ter pertencido a uma espada.

 - Um fragmento... Mas as Heranças Mágicas não são inutilizadas assim que a forma original é destruída?

 - Realmente, eles estavam trocando algo que supostamente não carrega nenhum valor, ainda que com riscos muito altos. Significa que a outra entidade dificilmente é um traficante ou um colecionador.

  - Hm? Por que não seria?

 Fazia algum tempo que uma marca invisível de interrogação flutuava sobre a cabeça de Takeru. Ouka não conseguiu esconder a irritação que ela segurava até então.

 - O que um amador qualquer iria fazer com um fragmento? As chances de o parceiro de troca vir de uma associação mágica são extremamente altas.

 - So-sociedade mágica... um grupo de feiticeiros e de bruxas? Ainda existe esse tipo de comunidade hoje em dia?

 “Bem, eu mesmo não posso falar nada, já que uso uma espada mesmo estando nessa era” - pensou Takeru. Para bruxas modernas, administrar uma sociedade mágica seria extremamente difícil.

 Mas Ouka não estava fazendo nenhuma piada. Ela fechou os olhos.

 - <Valhalla (Culto Ilusório)>, uma organização que está encoberta por mistérios. É um tipo de associação praticante de magia negra.

 Takeru ouvira aquele nome antes, entre os rumores se espalhando de vez em quando pela escola. Essa era uma das lendas urbanas mais populares. Bruxas e feiticeiros que sobreviveram a guerra se juntaram e buscavam derrubar a inquisição.

 Se tal história fosse verdade, seria um caos. As bruxas de antigamente, Takeru não imaginava como as armas modernas poderiam lidar com aqueles inimigos esmagadores. No passado, haviam muitas bruxas poderosas o suficiente para dizimar uma cidade inteira com uma rajada de magia.

 - E recentemente tem acontecido alguns incidentes estranhos, mas como nem bruxas nem Heranças Mágicas estavam envolvidos, a investigação foi dada à polícia. Ainda assim, eu não acho que não existe o envolvimento, essas pessoas estavam vendendo os cadáveres. As únicas que poderiam encontrar utilidade nos corpos são bruxas.

 - Mas... Esses dois casos estão conectados?

 - Isso mesmo, o criminoso que fugiu do incidente com o Dragoon de semana passada disse “ Também vamos comprar qualquer corpo fresco que tenham”.

 Takeru engasgou involuntariamente.

 Mesmo que seja cedo demais para afirmar que a associação se tratava da <Valhalla>, a conexão com o caso do <Salmos Sem-Traço> poderia mesmo ser vista. Ouka não tinha ideia de qual era o objetivo dos criminosos, mas pensando normalmente,

 - Eu acredito que eles estejam se preparando para alguma coisa. <Valhalla> ou não, o envolvimento de bruxas e Heranças mágicas está claro. Vou para o local de encontro do qual ouvi falar.

 - Quer dizer que nesses últimos dias você estava investigando os coletores de corpos sozinha?

 - Isso mesmo. As Heranças Mágicas apreendidas eram um objetivo secundário que veio dessa investigação.

 “Que mulher agressiva...” – Pensou novamente Takeru.

 - Bem, está tudo certo. Agora que você sabe, continue de boca fechada e volte para a sala do pelotão.

 - Nananinanão, espere aí. Se o oponente é <Valhalla>, então a missão não ultrapassaria a dificuldade para estudantes? Você não deveria relatar a situação para os <Dullahans>?

 - Humm... Os outros <Dullahans> estão soterrados por uma montanha de outros casos sem relação. Nenhum deles mantem contato comigo, de qualquer forma. Mesmo quando eu era uma Dullahan, eles fingiam que não estavam ouvindo e diziam que estava sob a jurisdição da polícia. Eu vou resolver esse caso sozinha.

 Ouka dizia tal enquanto uma luz pálida cintilava em suas pupilas.

 Do jeito que ela falava, parecia que ela estava investigando desde antes de ser rebaixada. Em seus olhos, algo parecido com persistência e obstinação poderia ser visto, mas Takeru não achava que era nenhuma das duas coisas.

 Era melancolia e ódio.

 - ...Agora você entende? As pessoas de quem estou atrás estão em um nível alto demais para vocês. Eles também não são reconhecidos como alvos da Inquisição. Vocês não ganharão pontos nenhum por completar essa investigação, então não há benefícios para vocês.... Por isso... Não venham.

 “Mesmo se vocês vierem, serão apenas um incômodo”, O modo de falar era um jeito de mostrar sua preocupação pelos outros membros.

 Ouka se afastava com passos barulhentos

 Takeru quase parara de andar, mas sabendo que Ouka estava envolvida em coisas tão perigosas e que iria sozinha, deixá-la ir significava a desqualificação dele como capitão.

 - Eu vou com você.

 - ... Por quê?

 - Por que..? Não podemos deixar que alguém, ainda mais ferida, saia sozinha. Já que mesmo dizendo para não ir, você não me daria ouvidos, pelo menos deixe que eu te acompanhe.

 Ouka franziu levemente o cenho.

 - ... Eu disse para você que minha ferida não é um problema.

 - Mesmo que não te incomode, isso vai atrapalhar os seus movimentos durante uma emergência.

 - Não vai acontecer, não dói tanto assim

 - Ainda que você aguente, parece bem doloroso.

 - Eu já disse que não dói nada!

 - Está doendo, não?

 - ... Está.

 - Como você é persistente.

 - Como você é teimoso.

 Vendo Takeru sem recuar um passo sequer, Ouka fez uma expressão honestamente irritada.

 No final, quem deu o braço a torcer foi Ouka.

 Depois que os dois terminaram de consertar o curativo, eles se abasteceram com o equipamento antes de se dirigirem para a cena do crime,

 Takeru propusera incluir Usagi e Ikaruga no time, mas a ideia fora rejeitada por Ouka. Ele queria dizer que ela estava de preconceito com as duas, mas dessa vez os dois estariam dentro de um local mais fechado, então um grupo menor era preferível.

 A localização era em um ancoradouro voltado para o mar, em um lugar que antes era chamado de Tokyo Bay.

 Era em uma construção relativamente grande, uma única estrutura rodeada por grama, perto da área de containers.

 Mesmo que aparentasse ser apenas outra construção abandonada, enferrujando no ancoradouro, algo parecia estranho. Incoerente às paredes gastas, os cadeados instalados eram novos em folha. Havia alguns pares deles e estavam conectando correntes.

 Definitivamente havia sinais de vida ali. Takeru e Ouka se posicionaram nos dois lados da porta e checaram o cadeado.

 Depois de ter certeza que não poderia ser aberto do jeito normal, Ouka tirou uma escopeta de cano serrado que trazia nas costas.

 Ela entregou a arma para Takeru. “Destrua o cadeado” era o que ela implicava com o gesto.

 ........ *Treme* *Treme* *Treme*.........

 - ...........

 Ouka não sabia da maldição de armas de fogo que seguia Takeru. No pior dos casos, era possível que ele acabasse matando Ouka com um tiro descuidado.

 Ela fez uma expressão desapontada e apontou a escopeta para o cadeado, tomando uma pequena distância.

 Disparos ensurdecedores ressoaram, a tranca foi destruída e a porta, aberta.

 Imediatamente, Takeru chutou a porta, escancarando-a.

 - Seu idiota! Eu deveria invadir antes d-

 Ouka tentou parar Takeru, mas naquele momento,

 *piinnn*, o som de algo metálico sendo puxado chegou até eles.

 - Kusanagiiiii!!!

 Chamado por ela, Takeru se virou.

 O que ele viu foi a figura de Ouka se jogando para abraçá-lo.

 Mas mais que um abraço, tinha sido mais como uma investida. Ele foi derrubado por ter ficado indefeso pela surpresa.

 Nesse momento, a doce fragrância de uma garota entrou em seu nariz, os lábios dos dois quase encostando, era exasperante. Sua consciência foi quase tomada pelos seus desejos naturais, mas em seguida, um enorme rugido veio atrás da segunda porta que ele estava prestes a arrombar.

 Depois de tossir um pouco da fumaça que os cercavam, Takeru entendera o que havia acontecido.

 - Isso foi... Uma armadilha?!

 - De pé! Temos que correr!

 Antes mesmo que Takeru percebesse, a figura de Ouka começava a correr para a parte de trás da construção. Takeru a seguiu imediatamente.

 - Que droga... Chegamos atrasados – lamentou Takeru

 Enquanto uma van começava a se afastar deles, as sobrancelhas de Takeru se juntaram.

 - Não, ainda não – disse ela.

Ouka trocou a munição para a letal e assumiu uma postura de tiro ajoelhada.

 E então, o cano da arma saltou para trás ao mesmo tempo em que disparava um único tiro.

 A van era tão pequena quanto uma ervilha.

 “Imaginei... Valeu a pena a tentativa”, Takeru, prestes a dizer isso, se calou, pois podia se ver a trajetória da van flutuar até que colidisse com um container perto. A van capotou com o telhado voltado para o chão pois a bala de Ouka havia acertado em cheio o pneu.

 - ...Só pode estar de brincadeira comigo.

 - As modificações ficaram incríveis... Mas o coice também ficou.

 Ouka dizia tal enquanto tirava o pente de sua pistola. Ela se levantou com um ar composto e elegante.

 Ela disse que havia sido graças à arma especial de Ikaruga e a rota retilínea da van de escape. Isso sem contar a falta de vento. Mesmo com aquela arma, naquela distância, os reflexos e habilidades ainda eram impressionantes.

 Takeru não conseguia acreditar no que havia acontecido bem na frente de seus olhos.

 - Kusanagi, verifique as pessoas da van, eu vou vasculhar a construção.

 - ... E-entendi, valeu por me salvar agora a pouc-

 - Não me agradeça, só ande logo com isso.

 Depois que ele foi repreendido, Takeru correu até o veículo de fuga. Ele já não sabia mais quem era estava no comando por ali.

 Ele algemou três pessoas que estavam desmaiadas ali e rapidamente voltou para a construção de antes.

 

Depois de chegar, ele entrou pela porta aos fundos. Assim que passou pela porta, ele percebeu algo de muito bizarro por ali.

 Um cheiro estranho. Um odor carnicento, nauseante.

 Takeru cautelosamente prosseguiu pelo corredor a frente, onde parecia ser a origem do forte cheiro.

 No final do corredor, havia um cômodo que era provavelmente um quarto de alguém. Atrás da porta escancarada ele encontrou Ouka.

 Tapando seu nariz, ele olhou o rosto dela.

 - ..........

 Ouka estava com os olhos arregalados e os movimentos totalmente ausentes. Takeru tentou dizer algo, mas então,

 - O que... Ughh......?!

 A intensidade do estranho odor era incomparável com o de antes, sua mão tapou as narinas involuntariamente.

 A cor de sangue e o cheiro permeando o quarto, Takeru sentiu seu estômago se revirar e assim ele entendeu o que se passava.

 Ali dentro, estava o próprio inferno.

 Empacotados em embalagens plásticas, estavam incontáveis partes humanas. Mãos, pernas, troncos, cabeças. Estavam todos divididos em cinco seções, embalados em plástico e classificados separadamente.

 Mas o problema de verdade estava em outro lugar.

 - .... Aaaaaa.... Aaa....

 Instintivamente, um pequeno gemido se formou do fundo da garganta.

 A cortina tremulava pelo vento e era iluminada pelo sol vespertino que entrava pelo quarto.

 A parede estava manchada por uma enorme quantia de sangue.

 No meio de todo esse inferno, no topo de uma cama, deitava uma jovem criança.

 No peito dessa criança, estava enterrada uma faca.

 - .................

 Seus olhos se estreitaram, sua expressão mostrava mortificação. Takeru mordeu o lábio.

 A cavalaria que viria salvá-la em cima da hora, como em um filme, não chegara. Era impossível no mundo real.

 A probabilidade de resgate era praticamente nula, ele estava ciente de tal. Quando Takeru decidira entrar para a Inquisição, ele sabia que seria daquele jeito. Ele estava preparado para ver cenas do tipo nos locais de missão.

 Sim, ele estava preparado para a situação, mas mesmo assim... Aquilo era...

 Aquilo era a realidade.

 - ...........

 Ouka estendeu a mão trêmula para o corpo frio do garotinho.

 Com o braço instável, ela ergueu o pulso do garoto e o abraçou como se segurasse um recém-nascido.

 - ....Me desculpe... Eu cheguei tarde demais.

 Uma voz cambaleante, gentil.

 - Foi muito doloroso? Você não precisa mais sofrer mais...

 Abraçando o corpo sem vida do menino, Ouka acariciava seu rosto.

  - Desculpa... Está tudo bem agora... Onee-chan... vai cuidar de tudo isso...

 Esse triste espetáculo, cheio de compaixão, Takeru não era capaz de olhar.

 Era muito entristecedor, inconsolável.

 - Onee-chan vai ... Tudo isso.

 Por isso,

 - Tudo!

 Por isso ele não percebeu a anormalidade em Ouka a tempo.

 Enquanto ele olhava para outro lado, Ouka pôs o garoto para descansar novamente e tirou a escopeta de suas costas.

 Ele não entendia o que estava acontecendo no momento, mas olhando para suas costas Takeru compreendeu.

 Não existem balas anestésicas para nenhuma escopeta e a de Ouka estava carregada com munição letal de mithrill.

 Ouka planejava matar as três pessoas dentro do carro.

 - Ootori!

 Takeru momentaneamente se jogou em sua frente e agarrou Ouka, que estava prestes a deixar o quarto para se dirigir aos criminosos.

 - O que você planeja fazer?!

 - Saia.

 - Pare, você não pode fazer isso! Se você matar aqueles imprestáveis, não vai haver mais segundas chances para você!

 - Me solte.

 - Se acalme! Mate eles aqui e todo o seu trabalho terá ido ralo abaixo!

 - Me solte, agora!

 Ouka tentava escapar das mãos de Takeru, furiosa. Sua face, molhada com as lágrimas, e as pupilas exibindo uma vontade assassina, quase gritando.



 Ao ver ela se debater, parecendo com um espírito maligno, um demônio, Takeru imaginou que precisava pará-la.

 Ele desesperadamente abraçou Ouka, ela abaixou a arma.

 - Eu não vou deixar que você faça isso! Você não se tornou uma inquisidora para evitar que outras crianças sofram o mesmo destino dessa?!

 - ...Ughh...!

 - Eu não te conheço direito, mas... Você com certeza não quer isso, quer?! Se você se descuidar aqui, você não vai mais poder salvar as pessoas como normalmente faria...!

 - Uu... uuu... uuuh...!

 - E você está bem com isso?!

 - Uuuu..... uuuuuhhhh........

 - A voz de Takeru havia finalmente atingido Ouka e toda sua força a deixou.

 Ela desabou de joelhos, largando a arma.

 Ouka cobriu sua boca com uma das mãos, vomitou e desmaiou logo em seguida.

 

 No cemitério da cidade, localizado longe da cidade ruidosa e ao lado de um parque.

 Já que o parque, coberto com as belas folhas de outono, fechava pela noite, ele era muito frequentado durante o dia.

 Vozes de crianças brincando no parque, casais trocando beijos.

 Essas felicidades pareciam tão distantes dos dois.

 Parados ali, lamentando, mostrando uma expressão melancólica, era a impressão que passavam para os outros visitantes.

 - .............

 Ouka estava de pé na frente de um único túmulo. Ela o encarava já fazia cerca de uma hora. Takeru estava pouco atrás, observando-a.

 Depois do incidente, Takeru contatou a tropa dos <Spriggan> e <Seeley>, reportou brevemente a situação e quis levar Ouka para o hospital.

 Mas Ouka recusou. Ao invés disso, ela desejou vir para aquele lugar sozinha.

 Takeru, nada inclinado a deixá-la sozinha, seguiu Ouka até então.

 - ... Sobre antes... Desculpe, eu não sei o que deu em mim – Disse Ouka com as costas ainda viradas para ele.

 - Por que você quis vir comigo?

 - Porque eu estava preocupado, é claro – Ele imediatamente respondeu.

 O cabelo de Ouka ondulava gentilmente enquanto ela se virava para Takeru.

 - ... Por quê?

 Uma voz tenra. A voz original de Ouka era dignificada e sem hesitações, muito ao contrário da atual.

 Inédita até então, a expressão frágil na face de Ouka. Ele inconscientemente encarou-a. Olhando para sua figura sonolenta e fatigada, Takeru mantinha um impulso inexplicável por abraçá-la naquele mesmo instante.

 - Porque eu sou seu capitão.

 - ... Isso de novo?

 - Ainda assim, eu quero que nos tornemos companheiros. O-ou ainda é muito...

 - Não existe ninguém que queira se tornar minha companhia.

 Respondendo Takeru negativamente, Ouka virou para a frente novamente.

 - Isso é desilusão sua, achar que não há ninguém.

 - Desilusão?

 Ouka aumentava o tom de voz.

 - Como com todo aquele meu descontrole de antes, por que você não diz o que pensa de verdade, “Capitão”?

 - ... Não é nada demais, eu só estava surpreso.

 Ouvindo a resposta sincera de Takeru, Ouka sorriu levemente.

 - Acho que você já sabe agora... Não importa o que seja feito, nada adianta. Quando eu enfrento um inimigo perigoso, o sangue sobre à minha cabeça. Eu fico fora de mim mesma e executo todos, aperto o gatilho e os mato. Especialmente quando as vítimas são apenas crianças.

 - ..........

 - <Calamidade>... é mesmo um nome que combina comigo.

 Nos incidentes em que ela estava envolvida, a resultado final sempre acabava com um mar escarlate de sangue deixado para trás. Por isso <Calamidade (Princesa Lótus Rubra)>. Mas ela não fazia isso por que queria fazer. Tal era o pensamento de Takeru depois de ouvir Ouka. “Com certeza tem algo mais profundo dentro dela que faz com que ela aja desse jeito”

 - Esse é o motivo por qual eu fui expulsa da Inquisição. Eu mesma não estou em posição para criticar nenhum vocês. Sou defeituosa e irreparável... É assim que eu sou – disse Ouka, seguido de um suspiro.

 Ela tirou anpan e leite que ela havia comprado em uma loja de conveniências pelo caminho, deixou uma oferenda na frente da lápide e juntou as mãos na frente de si.

 O silêncio dominava outra vez.

 - ... Esse túmulo, é da sua família?

 - ... É dos meus pais... E da minha irmãzinha.

 - Você tinha uma irmãzinha...

 - hm-hum, tinha.

 Ouka cutucava a garrafa com leite com um dedo.

 - ... Minha irmãzinha adorava anpan com leite.

 Aumentando fracamente o tom de voz, ela falava nostalgicamente.

 Era a primeira vez que ele ouvia Ouka falar tão gentilmente.

 - Eu dizia pra ela que não tinha como aquilo ser gostoso... “Coma, Coma!”, ela queria me fazer experimentar a qualquer custo.

 Takeru se calou e ouviu, ouviu tudo em silêncio.

 - Eu, teimosa, recusei várias vezes dizendo que deveria ser horrível. Ainda assim, ela continuava a insistir que era delicioso, bufava as bochechas, brava. Infantil, não? Se é delicioso para ela, tem que ser delicioso para todos os outros. Era assim que ela pensava.

 - ..................

 - No final, eu acabei sem provar nem um único pedaço enquanto ela ainda vivia.

 - .................

 - Mesmo que isso... Seja tão delicioso.

 Subitamente, a mão que brincava com a garrafa de leite foi abaixada.

 Seu cabelo cor de poente flutuava pelo vento, voando conforme o ar gelado.

 Takeru olhou para os ombros diminutos de Ouka, ele abaixou o olhar.

 Ele não deveria ter escutado, foi o que ele mesmo pensou. Se ele desviar o olhar agora, Ouka irá continuar a andar sozinha. Ele não podia deixar de pensar nisso.

 - ... Sua família foi...

 - ...........

 - ... E sua irmã....

 As palavras que ele deveria usar estavam enrascadas em sua garganta e não sairiam.

 Em uma hora como essa, ele não tivera coragem de entrar na escuridão das profundezas de Ouka. Takeru se sentia patético.

 Mas antes que Takeru pudesse dar o primeiro passo,

 - Ah... é mesmo.

 Ouka se levantou, ela olhou para trás vigorosamente e então, como se declarasse uma guerra interna,

 - Minha família morreu para uma bruxa.

 Ela disse como se tentasse se livrar da própria escuridão.


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